
E LÁ OS ENSINAVA (Lc 4,31-37)
Sobre o Evangelho desta terça-feira (03/09/2024)
Via de regra, os comentaristas deste Evangelho deixam que seu foco se desvie para o espetacular, ou seja, a manifestação de poder revelada em Jesus ao calar o demônio e exorcizar o possesso. É pena, pois o mais importante desta passagem é uma frase aparentemente marginal, quase ocasional, logo no início: “Jesus desceu para Cafarnaum e lá os ensinava”.
Aliás, basta percorrer as páginas dos evangelhos para perceber que Jesus dedicou muito mais tempo ao ensino do que aos exorcismos. Eu ouso dizer que Jesus expulsa demônios quase a contragosto, pois eles estavam atrapalhando o seu trabalho (sim, é um trabalho!) de pregador da Boa Nova.
Jesus nunca disse: “Eu vim para expulsar demônios”. Ele disse algo bem diferente: “Eu devo anunciar a Boa Nova do reino de Deus”. Ele não queria aterrorizar os presentes, queria que se alegrassem com a boa notícia do reino ao alcance de todos.
Claro, Satã se apresentava como “dono do mundo”, a ponto de tentar usar o mundo como moeda de troca na tentação do deserto (cf. Lc 4,5-6). E Jesus sempre soube que haveria combate quando ensinasse, ou a arena do demônio não seria mudada em reino de Deus. Mas a arma que ele esgrime é a Palavra. É a Palavra que liberta e cura. Ela é a “espada de dois gumes” (Hb 4,12) que penetra os corações e ali implanta as sementes do reino de Deus.
Se o reino do mal se caracteriza pelas trevas e pela tristeza, Jesus anuncia um reino de luz e alegria. Será que ninguém percebe que a reação dos ouvintes de Jesus é uma reação de alegria? E, com esta, a esperança, o ânimo e mesmo o entusiasmo. Não queriam fazer do carpinteiro um rei porque ele espantava demônios, mas porque sua Palavra colocava à disposição de todos um novo mundo pacífico, alegre e feliz.
A pregação de Jesus é simples, é sóbria, sem recursos à oratória e, com absoluta certeza, sem gritos para emocionar o auditório. Jesus de Nazaré sabe que a liberdade espiritual deriva do conhecimento da verdade (cf. Jo 8,32). Basta ensinar para libertar. À proporção que sua Palavra ilumina os corações, caem por terra as correntes da mentira e da treva interior. Mesmo sem água benta, o maligno perde terreno.
Os apóstolos sabiam disso. Por isso mesmo, deixam de lado outras atividades para se dedicarem “à oração e ao serviço da Palavra” (cf. At 6,4).
Orai sem cessar: “Minha porção, Senhor, é guardar tuas palavras!” (Sl 119,57)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.


IMAGEM DE CAPA:
Criança Rezando aos Pés da Mãe
Pierre Édouard Frère / França /1864
Grafite e aquarela com realce branco sobre papel bege, moderadamente grosso e liso
23 x 18 cm