JOÃO PAULO II E A ENCARNAÇÃO DA NÃO RESISTÊNCIA E DA VITÓRIA CONTRA O MAU

Santos em quem nos apoiamos - 3

ARTIGOSA IGREJA E OS FUNDAMENTOS DA FÉ

Rafael Andrade Filho

6/16/20244 min ler

Durante a sua peregrinação à Polónia em 1979, atrás da cortina de ferro do comunismo mais sanguinário já visto, João Paulo II disse as famosas palavras: “Deixe o Espírito descer e renovar a face da terra. Esta terra." A resposta da multidão foi cantar por 15 minutos, ininterruptos, ainda sob o risco de serem perseguidos: "Nós queremos Deus nos nossos livros poloneses. Nós queremos Deus nas nossas escolas polonesas"

Essas palavras de João Paulo concluíram uma homilia muito poderosa que permanece atual até hoje, pois apresenta uma comunidade de pessoas que se unem na sua luta pelos valores cristãos. Essas palavras mudaram as pessoas.

"Se não fosse a primeira peregrinação de João Paulo II à Polônia, em junho de 1979, não teria havido Solidariedade. O papa polonês como autoridade espiritual contribuiu para o colapso do comunismo. A peregrinação foi um evento inovador e sociologicamente poderoso, uma vez que toda uma geração de polacos tomou consciência do seu poder e sentiu uma onda de coragem para agir. As pessoas acreditavam que era possível permanecer fiel à verdade apesar do regime brutal e poderoso"", diz Paweł Skibiński, Ph.D., historiador da Universidade de Varsóvia em entrevista [1]

São Joao Paulo II encarna uma ordem e uma promessa de Jesus: "Não resistam ao mau..." e "...os portões do inferno não prevalecerão", que deveriam servir de apoio a qualquer missão, ainda mais nos tempos atuais.

Não resistais ao mau

Jesus disse: “Tendes ouvido o que foi dito: Olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao mau (a quem é mau). Se alguém te ferir a face direita, oferece-lhe também a outra (mostre-lhe o outro lado). Se alguém te citar em justiça para tirar-te a túnica, cede-lhe também a capa.” (Mt 5, 38-40). A instrução de Jesus pode soar como simples aquiescência ao poder da violência, mas não é bem isso. Há duas respostas clássicas para o mal: lutar ou fugir.

Quando confrontados com injustiça ou violência, podemos responder na mesma espécie – e às vezes em nosso mundo pecaminoso isso é tudo o que podemos razoavelmente fazer. Mas, como todo valentão da escola e todo agressor geopolítico sabe, isso geralmente leva a um ato de contra violência e, em seguida à outra retaliação, até que os oponentes fiquem presos em uma rodada interminável de lutas. Gandhi assim se expressou: "o olho por olho deixa o mundo inteiro cego". A outra resposta típica à agressão é fugir ou se submeter – e, às vezes, dada nossa situação finita e pecaminosa, é isso que fazemos. Mas, ceder à violência tende apenas a justificar o agressor e a incentivar mais injustiças. Portanto, parece que, no que diz respeito à solução do problema do mal, estamos presos em uma situação sem vitória, obrigados a oscilar entre duas estratégias profundamente insatisfatórias.

Na sua instrução sobre a não violência, Jesus dá-nos uma saída, e compreenderemos isso se atentarmos ao famoso exemplo que ele usa: "Se alguém te bater na face direita, oferece-lhe também a outra" (mostre-lhe o outro lado). Na sociedade da época, nunca se teria usado a mão esquerda para qualquer forma de interação social, já que ela era considerada impura. Assim, se alguém lhe batesse na bochecha direita, ele está batendo em você com a parte de trás da mão direita, e essa era a maneira pela qual se golpeava um escravo, uma criança ou um inferior social. Diante desse tipo de violência, Jesus não recomenda nem revidar nem fugir, mas manter-se firme. Dar a outra face é evitar que ele lhe bata da mesma forma novamente. Não é sair correndo ou aceitar, mas sim sinalizar ao agressor que você se recusa a aceitar ser atingido da mesma maneira, ou aceitar aquele conjunto de suposições que tornaram possível a sua agressão. É mostrar que você está ocupando um espaço moral diferente. É também, consequentemente, uma forma de espelhar para a pessoa violenta a profunda injustiça do que ela está fazendo. A grande promessa dessa abordagem é que ela pode não apenas parar a violência, mas também transformar o autor dela.

As portas do inferno não prevalecerão

Eu sua resposta a confissão de fé de Pedro (cf Mt 16,16), , Jesus respondeu com uma das mais extraordinárias palavras do Novo Testamento: “E eu te declaro: tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela.” (Mt 16,18). Jesus insiste que essa Igreja, fundada na confissão de Pedro, constituiria um exército tão poderoso que nem mesmo a própria capital fortificada do reino das trevas poderia suportá-lo. É fascinante a frequência com que esta frase de Jesus é interpretada precisamente na direção oposta, como se a igreja tivesse segurança garantida contra as investidas do inferno. Nunca se ouviu falar de algum exercito que lhe atacasse com um portão. O portão de uma cidade é que é atacado. Na verdade, Jesus está sugerindo uma imagem ofensiva: sua igreja sitiará com sucesso o reino do mal, derrubando seu portão e rompendo seus muros. E observe, também, como Jesus usa o tempo futuro – "Eu edificarei a minha igreja" (Mt 16,18). A integridade desta Igreja será garantida ao longo dos séculos, não através do apelo à opinião popular (por mais instrutiva que isso possa ser), nem através das ministrações de uma elite institucional ou teológica (por mais necessárias que sejam), mas sim através do conhecimento carismático do Papa sobre quem é Jesus[2].

João Paulo II ocupou um espaço moral superior contra os opressores. Ele quase foi morto pelos nazistas e depois foi profundamente oprimido e quase morto também pelos comunistas, mesmo assim ele voltou a esses lugares e disse às pessoas que estavam sob opressão “não tenham medo”, "Deixe o espírito descer e renovar a face da terra. Esta terra". Com isso ele foi decisivo na queda do comunismo. De onde vieram toda essa coragem e confiança? Não veio da política, nem da psicologia ou de qualquer coisa mundana. Ela veio de uma raiz profunda em Cristo, pela oração.


[1] https://poland.pl/history/historical-figures/pope-changed-poland/

[2] Barron, Robert . Catholicism: A Journey to the Heart of the Faith (p. 122). Random House Publishing Group. Kindle Edition.