
O Espírito do Evangelho: condescendência, compreensão e gradualidade
Pe. Elílio Faria Matos Júnior
5/3/2025
O EVANGELHOS NOS REVELA O CORAÇÃO DE DEUS, um coração que não se impõe pela força, mas que se inclina com ternura para encontrar cada pessoa no ponto em que ela se encontra. O espírito do Evangelho é, por isso, o espírito da condescendência divina — não no sentido de superioridade que humilha, mas da humilde inclinação daquele que, sendo todo santo, desce para caminhar conosco, para compartilhar nossa vida, nossas alegrias e nossas fraquezas.
Em sua missão pastoral, o Papa Francisco continuamente ressaltou que a lógica de Deus é a lógica da misericórdia, da paciência e do processo. Deus não exige perfeição imediata. Ele semeia a sua palavra nos terrenos muitas vezes pedregosos de nossas vidas e espera, com uma paciência infinita, o tempo da germinação, do crescimento e da maturidade. Como afirma o Papa, o tempo é superior ao espaço: importa mais iniciar processos do que dominar espaços.
Assim, o espírito do Evangelho é também o espírito da compreensão: compreender que cada pessoa caminha com seus próprios passos, que cada história humana é marcada por lutas invisíveis, que o amadurecimento espiritual e moral é fruto de um longo percurso, muitas vezes feito de quedas e recomeços. Compreender não significa aprovar o mal, mas reconhecê-lo no contexto de uma história ferida, a ser curada com amor e verdade.
Por isso, a gradualidade é parte essencial do olhar evangélico. Deus não rejeita a pequena centelha de bem que se acende no coração; Ele a acolhe, a protege, a alimenta, como se cuida de um pavio que fumega. A Igreja, fiel ao seu Senhor, é chamada a acompanhar, a discernir, a integrar, e não a excluir precipitadamente. Não se trata de diluir a verdade, mas de conduzir as pessoas, passo a passo, para que possam abraçá-la plenamente.
O Evangelho ensina que a conversão não é um ato mágico, mas uma história de amor construída no tempo. É nesse espírito que a Igreja, como mãe e mestra, deve se aproximar de todos: oferecendo a mão, esperando com esperança, corrigindo com mansidão, celebrando cada pequeno progresso, acreditando que a graça de Deus está em ação mesmo nas etapas imperfeitas da caminhada humana.
Assim se manifesta a verdadeira força da fé cristã: não na rigidez que julga e condena, mas na misericórdia que compreende e transforma. O espírito do Evangelho é, portanto, o espírito do Deus que caminha conosco, que nos ama como somos, mas que jamais deixa de nos chamar a ser aquilo que podemos ser pela sua graça.
* Pe. Elílio Faria Mattos Júnior, presbítero da Arquidiocese de Juiz de Fora, MG, professor de filosofia e teologia no Seminário Arquidiocesano Santo Antônio/Uniacademia, de Jui de Fora, e professor de teologia no Instituto Teológico Franciscano, de Petrópolis. Atua como formador da comunidade de filosofia no Seminário Arquidiocesano Santo Antônio.