ODRES VELHOS (Mt 9,14-17)

Sobre o Evangelho deste sábado (06/06/2024)

MT 9OS EVANGELHOS

Antonio Carlos Santini

7/6/20242 min ler

Este Evangelho nos convida a uma serena meditação acerca dos atuais debates e polarizações que têm como eixo o choque entre novidade e tradição. Há grupos nos dois extremos: por um lado, aqueles que reclamam um retorno radical a velhas formas e fôrmas, como a missa em latim, o hábito clerical e certo rigorismo moral; por outro lado, os adeptos de uma Igreja “democrática”, com ministros eleitos a partir da “base” e maior liberalidade em questões éticas, nem sempre de acordo com a moral do Evangelho de Jesus Cristo.

Segundo seu costume de recorrer a realidades do dia a dia da Palestina da época, como a semeadura, a vida pastoril, os hábitos domésticos etc., desta vez o Mestre traz nosso olhar para os odres – aquela espécie de cantil para água e outros líquidos, como o vinho. Ele nos recorda que os odres sofrem a ação do tempo, se ressecam e perdem a sua elasticidade original. Quando novos, resistem à expansão dos gases de um vinho novo; quando velhos, certamente iriam romper-se.

Também na vida eclesial existe esta realidade, que afetas pessoas e instituições: ressecamento, petrificação de hábitos, perda de mobilidade, o que oferece evidente dificuldade para a acolhida de eventuais “novidades” do Espírito Santo, a alma da Igreja. Um exemplo pode ser identificado nas Comunidades Novas, um novo Sopro do Espírito, reconhecido pelos últimos Papas, mas nem sempre recebido de boa vontade pelas estruturas paroquiais.

Ora, o próprio Evangelho é uma novidade radical em relação à antiga Lei do Povo escolhido. Também as cartas paulinas deixam evidente a necessidade de renovação interior e de constante docilidade às moções do Espírito de Deus. Como observa Hébert Roux, há uma descontinuidade entre a natureza e a graça. A graça não se acomoda à natureza, e pode vir como vinho novo, capitoso, em uma fermentação que ameaça velhas estruturas.

Foi assim com os discípulos de João Batista, que estranharam certa “liberalidade’ - e, por que não dizer, um “excesso de alegria” – por parte de Jesus de Nazaré. É assim, entre nós, com os católicos ressentidos com o “aggiornamento” proposto pelo Concílio Vaticano II, ainda que o mesmo Concílio seja sabotado aqui e ali.

O Evangelho é absoluta novidade. O Espírito é inovador. A Igreja não pode ser um museu, mas pode parecer mais o recreio de uma creche, onde criancinhas leves e ligeiras, alegres e ruidosas, comemoram com os pulmões cheios de ar o sopro sempre renovado do Consolador.

Orai sem cessar: “Eis que faço novas todas as coisas!” (Ap 21,5)

Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.

Imagem de Capa:

Não colocar vinho novo em odres velhos / Nicole Murray / 2014 / Austrália

Óleo sobre tela,

© Nicole Murray Art, Austrália