
ONDE COMPRAREMOS PÃO? (Jo 6,1-15)
Sobre o Evangelho deste Domingo (28/07/2024)
OS EVANGELHOSJO 6
Evidentemente, esta pergunta de Jesus dirigida ao apóstolo Filipe não passa de uma provocação amigável. Pão no deserto? Pão para cinco mil homens famintos, sem recensear mulheres e crianças? Pão em uma Palestina onde não havia padarias, pois o pão era fabricado de modo caseiro, no pequeno forno familiar no fundo do quintal?
Mas a pergunta provocativa ajuda-nos a lembrar outro deserto, outra multidão, outro líder seguido no êxodo do mesmo Israel. Ao deixar o Egito da escravidão e ver-se sem alimento no areal infértil (cf. Ex 16), o povo escolhido teve consciência plena de sua incapacidade para matar a própria fome. É a oportunidade para o Senhor fazer cair o maná, um provisório “pão do céu” que não resultava do suor humano, da terra trabalhada, mas era puro dom, pura graça.
Desde os primeiros tempos, os Padres da Igreja viram na multiplicação dos pães uma sinalização antecipada da Eucaristia. Jesus Cristo nos daria um “pão do céu” que seria o alimento e a fonte de energia para uma comunidade de discípulos a caminho da Terra Prometida.
Sim, o Senhor aceita trabalhar a partir de nosso próprio trabalho: os cinco pães de cevada (isto é, de baixa qualidade) que um garoto (um daqueles imprestáveis que a gente nem se preocupa em contar!) trazia na matula. E a partir dessa (miserável) contribuição, Deus entra em ação e faz maravilhas impensáveis.
Não podemos fazer vista grossa para a perfeita identidade de gestos e palavras que Jesus adota na multiplicação dos pães e na celebração da Última Ceia: tomar os pães... dar graças [no texto grego, eucharistésas]... distribuir aos convivas... Sem dúvida, trata-se do mesmo ritual com que os evangelhos sinóticos introduzem a narrativa da consagração na Ceia e que, na época em que São João escrevia seu Evangelho, teria sido adotado na liturgia primitiva.
Teriam percebido aqueles comensais o precioso sinal que Jesus lhes dava? Provavelmente, não. Nossa fome costuma limitar-se ao estômago, sem chegar ao fundo da alma. E se a multidão quer fazê-lo rei (cf. Jo 6,15), seguramente é para ter o pão de graça, ter um milagreiro à disposição, mas continuar a alimentar-se dos “alimentos terrestres” e, enfim, morrer como aqueles que comeram do maná...
Com que pão temos matado a nossa fome?
Orai sem cessar: “Saciarei de pão os seus pobres...” (Sl 132,15)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.


Imagem de Capa
O Milagre dos Pães e dos Peixes / Juan de Espinal / 1750
Material: óleo sobre tela
Dimensões 203 cm x 185 cm
Câmara Municipal de Sevilha