
QUE OS MORTOS ENTERREM SEUS MORTOS (Mt 8,18-22)
Sobre o Evangelho desta segunda-feira (01/07/2024)
OS EVANGELHOSMT 8


Sem dúvida, este é um Evangelho que costuma incomodar muita gente. Às vezes, ele chega mesmo a gerar revoltas do ouvinte diante de uma aparente insensibilidade de Jesus diante da morte de nossos amados. Ora, se o próprio Jesus não conteve as lágrimas diante da morte do amigo Lázaro (cf. Jo 11,35), é óbvio que tal insensibilidade não corresponde à verdade.
Espero que algumas pessoas se sintam melhor lendo o comentário de Ir. Carine Michel, O.P.:
“A ordem de Jesus é clara: ‘Segue-me!’ E será que isto não basta? Por que será, então, que Jesus acrescenta: “Deixa que os mortos enterrem seus mortos” ? Confesso que tenho dificuldade em compreender isto. Jesus iria impedir que seus discípulos acompanhassem seus mortos ao cemitério? Isto me parece incompreensível. Sobretudo porque isto está ligado a uma experiência pessoal.
Minha família foi atingida por dois falecimentos muito próximos um do outro. Estas experiências dolorosas me permitem, hoje, entender de modo diferente a frase de Jesus. Quando morre uma pessoa, não está em questão apenas aquela que morre. As relações com seus próximos morrem na forma que elas existiam nesta vida sobre a terra. Segundo minha experiência atual, uma parte de nós mesmos morre com o defunto que nós choramos. E nós devemos ter a aceitação de deixar partir o que não existe mais, para deixar que brote de novo a vida.
É assim que eu definiria o itinerário do luto: aceitar a morte para acolher a vida. Isto significa admitir a morte da pessoa amada de uma parte de si mesmo. Renasce aquela vida vivida juntos, mas interiorizada, e com certa vitalidade que jorra do fundo de si.
Jesus não pede ao discípulo que não enterre seu pai. Ele lhe diz: ‘Nesta provação do luto, segue-me, vai em direção à vida. Aceita que morra uma parte de ti ao enterrar teu pai, a fim de poder renascer para a vida’. Quando Jesus nos chama a segui-lo, é sempre para um acréscimo de vida: ‘Escolhe, pois, a vida!’”
Às vezes, os autores espirituais falam em “morrer para o mundo” como condição para seguir a Jesus. Tais palavras não constituem, de modo algum, um convite fúnebre. Muito ao contrário, trata-se de trocar um tipo de existência frágil e passageira por uma vida que vai muito além da morte...
Orai sem cessar: “Escolhe, pois, a vida!” (Dt 30,19b)
Texto de Antônio Carlos Santini, da Comunidade Católica Nova Aliança.
Imagem de Capa:
O Sermão da Montanha / Fritz Petersen / 1927