
VATICANO II: NARIZ TORCIDO?
A IGREJA E OS FUNDAMENTOS DA FÉ
Hoje cresce uma onda de católicos que rejeitam o Concílio Vaticano II ou ao menos lhe torcem o nariz. Qual seria o motivo?
Penso, antes de tudo, que o concílio é legítimo, não pode ser cancelado nem nunca o será. É o último da série de 21 concílios ecumênicos da Igreja católica. A autoridade que sustentou os 20 concílios que o antecederam é a mesma que sustenta o Vaticano II, ou seja, a autoridade máxima da Igreja, papa e bispos de todo orbe católico em comunhão.
O concílio quis renovar uma Igreja — e isso ficou mais claro com o próprio desenvolver-se do evento — que se tinha encastelado por causa das grandes mudanças operadas na modernidade (revolução científica, revolução política, revolução industrial, revolução social, questionamento das bases mesmas da civilização ocidental cristã…). A Igreja entendeu que não podia conservar-se numa atitude reativa, mas precisava dar passos em direção a uma postura propositiva. Compreendeu que seu papel não podia reduzir-se a condenar as novidades, mas era preciso mudar o olhar ou mudar o paradigma de sua visão, tanto quanto o permitia e até o estimulava a essência do evangelho.
No concílio a Igreja, pela primeira vez de modo oficial, procurou discernir e distinguir a essência mesma da mensagem divina de que é depositária e a roupagem histórica e cultural com que essa mensagem é apresentada. A Igreja estava tornando-se irrelevante diante de um mundo mudado por causa de certos acessórios históricos e culturais que pareciam estranhos ao mundo pós-polirrevolucionário.
O concílio foi o estuário e também o início de movimentos renovadores intestinos. Como estuário, recolheu os frutos de forças renovadoras já em atuação desde o século XIX: renovação da eclesiologia, renovação da moral, movimento litúrgico, movimento bíblico… Como novo início, estimulou direta ou indiretamente novas teologias e práticas. Talvez aqui, como novo início, esteja o grande motivo da rejeição de muitos ao concílio. No pós-concílio houve experimentos não felizes, como era de certa forma de se esperar diante do espírito fortemente renovador então presente.
Um dos grandes equívocos, a meu ver, foi a rejeição da metafísica em teologia e o obscurecimento do caráter sacral da liturgia. Hoje, esses dois equívocos estão sendo reparados pelo reconhecimento, por parte de grandes homens da Igreja, da importância da metafísica em teologia e da natureza sacral e contemplativa da liturgia, que não deveria simplesmente replicar o mundo da vida ordinária, mas oferecer um espaço e um tempo de verdadeira transcendência. Sobre isso, eu gostaria de falar com mais desenvolvimento em outra ocasião.
Pe. Elílio Junior é Teólogo e Filósofo, mestre em Filosofia e em Teologia Moral pela Accademia Alfonsiana (Pontificia Università Lateranense), de Roma. Atualmente, o Pe. Elilio Junior é professor do Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora.
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