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MEDITAÇÕES SOBRE A REVELAÇÃO - PARTE IV

Reflexões sobre a revelação divina, a Importância das escrituras e como interpretá-las segundo instrução da Igreja. Estas reflexões compõem um estudo comentado sobre a constituição dogmática Dei Verbum sobre a revelação divina.

Rafael Andrade Filho

7/16/20253 min ler

ORGANIZANDO E ENTENDENDO O TEXTO

PREMISSA MAIOR:

A igreja transmite pela tradição o que recebeu dos apóstolos. No entanto, esta tradição é viva e continua entendendo a revelação através do tempo.

Como a revelação é entendida no tempo?

Pela ação do Espírito Santo.

AGORA MEDITEMOS:

A teologia sempre se move adiante. Sem a tradição viva que continua a pensar e a fazer perguntas, não calcificada nos primeiros séculos a Igreja esgotaria o que teria para dizer frente às questões de seu tempo. E, como Jesus mesmo prometeu, ele enviou o Espírito Santo para estar conosco eternamente e para revelar-nos toda a verdade. Então, a Escritura atesta que a tradição e o dom do Espírito Santo é o que mantém a tradição viva, aprendendo a verdade. E para que este presente deixado por Deus não seja privilégio de um único indivíduo, é necessário que exista um corpo místico, um corpo apostólico. Tudo isso é atestado pelas Escrituras e pela própria história das Escrituras, a qual está atestada também nas Escrituras.

Consideremos a ideia de acomodação divina, como discutido na Parte II desta série de meditações. Se cada pessoa precisasse ler a Bíblia e individualmente discernir a verdade por meio do Espírito Santo, isso lhes imporia uma imensa pressão e responsabilidade. Cada indivíduo teria que reinventar a ortodoxia cristã, enfrentando sozinho as complexidades da fé. Por esse raciocínio, o protestantismo, em seu ideal, pode parecer uma jornada elitista, onde tempo e recursos são necessários para cada um responder todas as perguntas. No entanto, muitos protestantes, que não dispõem desse tempo, acabam sendo guiados pela tradição de suas próprias Igrejas. Vejamos, por exemplo, a metáfora de fé de Kierkegaard, um luterano, que comparava a fé a se agarrar a um pedaço de madeira após um naufrágio em meio a uma tempestade existencial. Isso é altamente angustiante. Em contraste, pensemos em termos de acomodação divina: seria desumano da parte de Deus exigir que cada um resolvesse as questões da fé por si mesmo, com a ameaça do inferno em caso de falha. Aqui entra a Igreja. Ela é um presente divino; somos seres sociais e aprendemos em comunidade. Deus nos revelou sua vontade através de seu Filho, da encarnação, e do corpo de fiéis. Desse modo, Cristo continua presente, de forma sacramental na Eucaristia, e por meio da Igreja, seu corpo místico.

Isto é acomodação. É o inclinar-se de um Deus condescendente em humildade, para dar algo de acordo com nossas limitações e capacidades, de maneira que possamos conhecê-lo. E é dentro desta instituição humana, que Ele mesmo instituiu, é que Ele nos trará em segurança até o porto da salvação.

Texto de Rafael Andrade Filho.

Seguimos com nossa leitura comentada sobre a Dei Verbum. Para ler o estudo prévio do prefácio, clique Aqui.

Leiamos agora o capítulo II, número 8:

A sagrada Tradição

8. E assim, a pregação apostólica, que se exprime de modo especial nos livros inspirados, devia conservar-se, por uma sucessão contínua, até à consumação dos tempos. Por isso, os Apóstolos, transmitindo o que eles mesmos receberam, advertem os fiéis a que observem as tradições que tinham aprendido quer por palavras quer por escrito (cfr. 2 Tess. 2,15), e a que lutem pela fé recebida duma vez para sempre (cfr. Jud. 3)(4). Ora, o que foi transmitido pelos Apóstolos, abrange tudo quanto contribui para a vida santa do Povo de Deus e para o aumento da sua fé; e assim a Igreja, na sua doutrina, vida e culto, perpetua e transmite a todas as gerações tudo aquilo que ela é e tudo quanto acredita.

Esta tradição apostólica progride na Igreja sob a assistência do Espírito Santo. Com efeito, progride a percepção tanto das coisas como das palavras transmitidas, quer mercê da contemplação e estudo dos crentes, que as meditam no seu coração (cfr. Lc. 2, 19. 51), quer mercê da íntima inteligência que experimentam das coisas espirituais, quer mercê da pregação daqueles que, com a sucessão do episcopado, receberam o carisma da verdade. Isto é, a Igreja, no decurso dos séculos, tende continuamente para a plenitude da verdade divina, até que nela se realizem as palavras de Deus.

Afirmações dos santos Padres testemunham a presença vivificadora desta Tradição, cujas riquezas entram na prática e na vida da Igreja crente e orante. Mediante a mesma Tradição, conhece a Igreja o cânon inteiro dos livros sagrados, e a própria Sagrada Escritura entende-se nela mais profundamente e torna-se incessantemente operante; e assim, Deus, que outrora falou, dialoga sem interrupção com a esposa do seu amado Filho; e o Espírito Santo - por quem ressoa a voz do Evangelho na Igreja e, pela Igreja, no mundo - introduz os crentes na verdade plena e faz com que a palavra de Cristo neles habite em toda a sua riqueza (cfr. Col. 3,16)."